Depois de cinco torturantes horas
papel na mão, mão na caneta, caneta no papel,
sem letras, sem motivos,
branco, branco, branco,
de tão inconformado rumo,
cansei e fui tomar cerveja.
E eis que após o patati patata com os amigos,
esporte clube bebuns da esquina,
me surge a musa,
desnuda, descabida, enfeitada,
sorrindo toda abusada.
- Vim lhe trazer o encanto!
Agora senhora! Agora malvada!
Depois do tanto que juntei palavras xoxas,
rimas fracas, frases que mereciam um tapa!
- Sim, agora, pede espaço para os compadres,
o lápis para o garçom, alguns guardanapos e vamos as maravilhas!
Moça, apesar do seu manequim
casar com meu desejo,
e ter ainda alguns lampejos de consciência,
saiba que não sou trabalhador de toda hora,
existem regras para isso.
Tem a hora de comer, beber, deitar para sexuar,
deitar para dormir, a hora chata do banco,
rezar para ter garantias, a hora do chefe, do cinema,
da prima, da tv, do bate bola,
tem hora para tudo, tudo tem sua hora.
- Gajo, não me enrola, clamou eu vim,
meu relógio segue a hora mágica,
para os poetas a poesia tem deferência
e preferencia sobre todas as outras coisas humanas.
Engano seu doce mula .... MUSA...perdão MUSA,
a poesia agora espera na fila enquanto baixa o vídeo no youtube,
petisca nas fases que caem o game via net,
rabisca enquanto ainda não lançaram o novo mangá,
ou arrisca quando esta chovendo demais
para dadaisar o muro alheio.
A poesia é agora um exercício valendo nota
de professores rotundos do ginasial,
deixou de ser a tempos
a voz que se espalhava pelo mundo,
transmitindo a verdade que não queria calar,
transformando seres plásticos em vivas almas
coloridas, acaloradas, rejuvenescidas.
A poesia agora é mais um oficio,
bate ponto, tem inicio, hora do café, almoço,
preenche relatórios, lança em gráficos,
powerpoint animado, vende, compra,
paga o rombo dos cartões de crédito,
perdeu seu encanto, romantismo, antigo mérito...
E enquanto contava
o rumo atual da poesia,
falando e falando,
motivado não pela musa
mas pelo mé,
a formosa foi se apagando,
calada e preterida.
Ai num dado momento me percebi novamente sozinho,
em meio ao burburinho, garçons, habitués,
a mão no copo, o copo na mão, a mão na mesa,
a mesa no bar, o corpo saindo pela porta,
através das pessoas, através do tempo,
o corpo indo, livre, o corpo poetisando.
San, 22/02/13