terça-feira, 27 de maio de 2014

Renascer



Se diluir,
transpor a imagem 
de si mesmo,
ganhar espaços 
incalculáveis,
atingir dimensões
transformadoras.

E para ser assim
é preciso
abandonar o controle
que o medo exerce
e exercer o poder
que o medo teme.

Voar naquilo 
em que outros
ainda se arrastam,
caminhar na solo
onde ninguém mais
tenha pisado. 

Isso tem a consciência,
pura mágica,
física e imaterial, 
poderosa alavanca
que projeta sonhos
nunca antes percebidos.


San, 21/02/81

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Frêmito


Já ouvi 
que minhas poesias 
são escuras, melancólicas, 
pessimistas, doloridas. 

Respondo que escrevo 
sobre aquilo que vejo, 
no momento, 
na realidade
 em que estou. 

Tenho culpa de escrever 
imersa num suspiro
tenebroso e violento 
do mundo?

Algumas pessoas fotografam,
eu disponho em palavras
a confusão 
da humanidade.



San, 02/02/2014

Ainda dói as sextas feiras

Eu lhe dei 
meu coração.

E o que você fez 
com ele então?

Pesou, mediu, 
cortou em filetes 
e analisou.

Meses sem fim 
o observou 
no seu potente 
microscópio 
de ultra definição.

Dias inquiriu,
noites anotou,
dias comparou,
noites avaliou.

Então o pequeno
já dormente
foi considerado
incompetente
para lhe trazer a solução
das grandes questões
emocionais
do seu mundo particular.

Pensava eu 
que amor fosse algo 
imponderável,
irrestrito,
aberto,
expectante,
em crescente movimento.

Descobri que para lhe amar
é preciso uma ferramenta a mais
uma daquelas que são
extremamente raras
algo que somente os técnicos
mais experientes
podem captar a essência.

Meu coração torno,
meu coração chave inglesa.

Meu coração bico de bolo,
meu coração saladeira.

Meu coração vaso de flor,
meu coração pá de mexer terra.

Meu coração fita adesiva,
meu coração grampeador.

Meu coração ferrolho,
meu coração pé de mesa.

Meu coração garfo e faca,
meu coração frigideira.

Meu coração esferográfica,
meu coração apontador.

Meu coração lençol,
meu coração toalha.

Meu coração banal,
meu coração igual,
a tantos corações
que vivem por aí,
construindo casas,
criando filhos, 
pagando contas,
segurando a mão
na hora da injeção.

Meu coração incapaz 
de lhe dar 
o amor mistico, 
mágico, 
envolvente,
revelador,
meu coração igual
a tantos corações
que vivem por aí.


San, 16/05/2014

Rest in peace

Gostamos

de finais felizes

pois

no mundo real

todos morrem

no final.



San, 16/05/2014

domingo, 11 de maio de 2014

Oceano

Mergulha
entontado
e sofrego
no passado.

Sedento,
desesperado,
desatento.

O que busca?

Não sei,
nunca soube,
tudo é mistério
nos meus momentos
dispersivos-sérios,
ansioso espero
flecha já lançada
não sei no que
e por que
atingir seu alvo
certeiro.

E ai lhe vejo
um sorriso
que dança
no escuro
tão amplo
solto
e púbere,
impossível não rir
e não ir
na sua loucura.


San, 10/05/2014

De profundis

Na falsa dor
da morte
amor
a paz 
que tanto
supus
lhe dar
estava ali
tão perto-distante
tão certo-duvidoso

Impuro
eu sei de tudo
e a mim mesma engano
para viver
mais um dia
sem dano.


San, 10/05/2014

Van Gogh


Seu grito é profilático
na dança espasmo
me vejo olhando a parede
a me perguntar -
Por que não conseguia enxergar
tão longe?

Seus dedos inquietos
caquéticos cacos poéticos
me indicam
não respostas
mas as falsas placas
tolas indicações 
que tanto segui.

E agora 
não quero lhe contar
as antigas histórias
mas das deslumbrantes
e luminosas
incertezas.


San, 10/05/2014