segunda-feira, 30 de junho de 2014

3 cm

 
Eu não me encaixo.

Minhas idéias sempre ultrapassam as bordas dos conceitos conhecidos e transbordam para outros níveis, sem no entanto me formatar em algo especifico.

Eu não me encaixo.

Caber em algo, algum nome, algum grupo, ideologia, igreja, família, ter exatidão, por certo tornaria minha vida mais fácil, simples, mas muito menos interessante.

Eu não me encaixo.

E começou cedo, observando o que meus pais diziam e o que faziam, o mesmo com a igreja, os amigos, as pessoas na rua, os livros, a natureza, desses somente a natureza parecia ter nexo, seguir um curso bem orquestrado.

Eu não me encaixo.

Aprendi a usar meias palavras, me esconder, apenas ouvir, não ser contundente, perguntar pouco, deixar as afirmações para os outros.

E sempre considerei totalmente estranha essa necessidade da sociedade de nos empurrar para frente, crescer sem limites, abrir a mente para a imaginação, as asas para o futuro, tudo isso sem sair da caixa, talvez pulando de uma caixa para a outra.

Eu não me encaixo.

Um dia peguei a tesoura da insanidade (dizem que é isso!) e fui cortando todas as caixas que encontrava, fazendo buracos (ninguém entendeu e nem me perguntou nada), fazendo furos grandes e pequenos.

Fui contida, fui analisada, fui medicada, cuidada um pouquinho e depois deixada de lado (sem a tesoura é claro).

Mas me sinto feliz, fiz diversos buracos, em diversas caixas.

Agora quem está lá dentro pode respirar melhor, sentir o sol, cheirar o mato, ouvir o canto dos pássaros ou a minha musica que vem de longe.

Eu não me encaixo

San, 21/02/2012

sábado, 28 de junho de 2014

Até a próxima curva 1


Tenho carregado meu amor para onde vou,
lugares arejados, amplos, verdes, limpos, ensolarados,
sujos, escuros, cinzas, gelados, diminutos, atulhados.

As vezes estou entre centenas de pessoas,
vozes, risadas, danças, musicas, movimentos,
em outras posso andar quilômetros sem viva alma.

Mas em todos os lugares, em todos os momentos,  
de todas as formas, em todas as situações
não sinto que meu amor pertence a aqueles lugares.


Tenho carregado meu amor para vernissagens,
óperas, teatro amador, semana cultural, sarau de poesia,
dança de rua, feira de antiguidades, palestras filosóficas,
até mesmo inauguração de hospitais.

Está ficando pesado,
carregar tanto amor 
para nada e ninguém.

Mas continuo caminhando,
caminhando e desejando,
desejando e sonhando,
sonhando e me frustrando,

Acordo animada e decidida,
a tarde já me sinto oprimida
dividida entre continuar a jornada
ou parar no próximo ponto.

De noite esqueço todas as ilusões
e me entrego apenas as necessidades, 
banalidades, leves tolices, 
sem pesos, sem medidas, sem caminhos,
somente flutuando no aqui e agora.



San, 28/06/2014

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Psicografia




Na história da minha vida muitos seguram a caneta. 

Os meus ancestrais pelo meu código genético.

Os meus pais pelas primeiras instruções de moralidade.

Meus professores pelos conceitos ideológicas.

Meus hormônios e substâncias neurotransmissoras 
respondendo ao ambiente imediato.

Sim, vejo que muitos seguram minha caneta. 

Mas sou eu que decido o que escrevo, 
mesmo com tanto apoio ou tanta amarra. 

Eu escrevo com letras pontuadas pela dor 

da quase imobilidade 
ou da fúria da liberdade, 
as vezes palavras pingadas, 
de cansaço, 
outras jogadas pela necessidade.

Mas sou eu que decido 

o que escrevo.


San, 26/06/2014

Acordada



De madrugada uma parte da minha mente dorme
então posso jogar sinuca sossegada com a poesia,
posso escutar sons inacreditáveis
na calma que a madrugada permite.

Não tem os ruídos da lamentação
as listas de coisas para concluir,
não tem os deveres do mundo
e nem os choramingos
da criança que ainda esta aqui.

De madrugada todos dormem
como devem dormir
enrodilhados no cobertor
como bons cães cansados.

Ai me levanto sem fazer barulho
nas pontas do pé 
como uma alma sorrateira
e me junto a mente livre
que vagueia por ai
a mente que não é de ninguém
nem mesmo minha
a mente prenha
de poesias.


San, 26/06/2014

De mãos nuas

Primeiro me fazem crer
que tenho uma necessidade,
que ela é minha,
legitima,
desejada desde sempre 
por mim.

Depois inventam
as partes da história
que faltam,
de como essa necessidade
sempre esteve ali
em criança,
adolescente,
mulher adulta, 
enquanto trabalhava,
amava,
estudava,
criava filhos,
envelhecia.

Ai me mostram
todas as coisas que estão ligadas
a essa necessidade,
pequenas coisas aparentemente estupidas,
mas que são na verdade pecinhas essenciais
para que as coisas realmente aconteçam,
e são centenas de pecinhas
milhares
ontem, hoje, amanhã
por toda eternidade.

Eternidade,
que palavra engraçada,
não é palpável,
é embrulhada em mistério,
no entanto alguns enxergam
tudo que precisarei nela,
para chegar a ela,
para me manter nela.

E o mais estranho dessa necessidade
é que preciso de assessoria constante
para entende-la e aceita-la, 
preciso de ajuda especializada
para manter-me no caminho de supri-la.

Ajuda de pessoas que não me conhecem,
que eu não conheço,
que nunca significaram nada para mim
e vice versa,
que não estiveram nos meus piores momentos
e nem nos melhores.

Acho que isso é a tal  pedra no caminho,
a tal pedra que parece preciosa,
a tal pedra brilhante
que lhe cega e dá tontura,
aquela mesma que já chutei sem querer
e arrancou parte da minha unha do dedão.

Desculpe amigo
já tenho minhas necessidade básicas
prementes
inerentes ao corpo físico.

Por que assumir outras?

Ser tão precisante para existir?

Quero chegar ao fim do caminho
largando bagagens
de mãos nuas,
sem pesos,
sem medidas,
sem as coisas fúteis.


San, 26/06/2014

Mundos perdidos


Da negação do meio 
a negação de mim
não quero estar nessa falsa festa
sorvendo esse veneno.

Todas as coisas que me oferecem
únicas e excepcionais oportunidades
de faltar com a verdade
daquilo que desconheço.

Mas procuro
tantas partes minhas
que estavam aqui
espalhadas pelo medo.

Não quero suas respostas prontas
embrulhadas em luzes que piscam sem parar
suas formidáveis sensações táteis
seus cheiros inventados.

Quero apenas o banal cotidiano
duro, seco, cortante, sem glamour
borda-lo eu mesma
com as linhas da consciência desperta.

Me deixe mundo novo
sou uma pessoa antiga,
uma pessoa de um tempo que foi esmagado
pela ansiedade de possuir.

Não quero ser aquilo que oferecem
não quero ser aquilo que poderia
não quero ser aquilo que me vendem
acordo mais um dia no cinzento sonho.


San, 26/06/2014

sábado, 21 de junho de 2014

Destoando

E eu escuto belas notas 
destoando
são coisas saindo
de um mundo 
que vai terminando.

Ecos de gritos e risadas
embalam minha incoerência,
empurram minha vida parada.

Eu tive paciência até aqui
eu tive desejos até aqui
eu tive perguntas até aqui.

Deixo cair minha duvidas
as leve mar revolto 
coisas que não voltam mais.

Deixo cair meu corpo
me leve mar revolto
coisas que cortaram meu coração

Deixo cair minhas certezas
leve longe o mar revolto
coisas que deixaram saudades.

Mesmo sendo mentiras
saudades 
mesmo sendo delírios
saudades.

Acho que fui eu 
que criei essas lembranças
e moldei essas imagens.

Saudades
de mim mesma 
a mesma 
que seja a mesma.

San, 21/06/2014

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Sem mais sem menos


Gosto de pensar que você está aqui
participando das minhas loucuras.

As vezes jogo um beijo por cima do ombro,
pergunto se está tudo bem contigo,
dou uma risada e continuo o que estava fazendo.

É tão normal para mim acreditar 
que está ao meu lado
mesmo que estejamos separados
pelo tempo, geografia, encarnação,
nada disso me incomoda ou lhe diminui.

Gosto de amar você
é uma forma de exercitar o meu amor.

E quando o mundo é realmente desagradável,
e as coisas estão muito ruins,
eu me consolo deitando no seu colo,
mesmo que aparentemente seja um travesseiro.

Não importa quantas vezes me digam
que apenas sonhar não faz algo acontecer.

Hello!!! Estamos num mundo de sonhos,
tudo é e sempre foi pura ilusão.

E se as pessoas constroem uma casa, uma família,
uma profissão, um caminho, diversos relacionamentos,
se compram bens, acumulam, experimentam,
mesmo sabendo que vão morrer
e não levarão absolutamente nada com elas
então como podem querer me dizer o que é ou não real.

Real é o que eu sinto,
real é o que me faz bem,
real é o que eu quero,
você sempre foi real para mim.


San, 19/06/2014




quarta-feira, 11 de junho de 2014

Nau dos insensatos

Eu toco 
para as pessoas
que embalam 
meu pensamentos,
lembranças 
de mágicos momentos.

Virando essa roda-rota
mundo coisa estranha,
ainda não entendo
mas vivo em suas entranhas.

Queria que o tempo fosse
amigo e companheiro
e não ter a sombra
dos mortos nesse outeiro.

Queria que os homens fossem
eternas crianças brincando
sem regras, sem crenças,
sem guerras pelo dinheiro.

O mundo então se despede
- Adeus minha andarilha!
  Um dia nos encontraremos
nessas dobras sujas da vida!

Então nada me resta
que tocar no meu violino 
as melodias estranhas
do enigmático destino.

Então nada me resta
vai chorando meu violino
o karma dos homens
estupido e trágico destino.


San, 11/06/14