terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Cansaço


Está pesado segurar essa mentira,
manter essa mentira,
alimentar essa mentira,
confiar nessa mentira,
declarar essa mentira.

Perdi meus dois braços
e um dos olhos,
meus cabelos branquearam
e minha pele ficou manchada,
minhas costas curvaram
e meus dentes trincaram
ganhei barriga 
e melancolia.

Virei uma pessoa
com extremo medo
de perder
aquilo
que nem tenho.

Todo dia é o dia da verdade
mas eu não a reconheço,
eu poderia abraça-la
de frente,
assim com coragem,
mas prefiro sair de fininho
pelos fundos.

Esta pesado segurar
essa mentira,
tão pesado!

San, 19/02/13

Dando uma banana para o mundo

 
Tem gente demais no mundo,
isso é uma imensa e potente
fabrica
de fuque fuque.
 
E todo mundo fuque fuquea
sem pensar nas consequências,
nove fora e esta ali um novo ser,
comendo, cagando, berrando,
tocando musica alto
e criando indisposição.
 
Assim o mundo fica
pequeno demais
para tanta gente que precisa
e quer
tanta coisa,
o mundo todo
fica pequeno demais.
 
Tem que ter casa para abrigar,
agua de lavar,
escola para ensinar,
terra para plantar,
panela para cozinhar,
e é claro cama para fuquear,
mas se não tiver faz igual bicho,
na praia,
no chão,
no riacho,
atras da moita,
para isso o homem
é sempre inventivo.
 
Tem muita gente no mundo,
mas o mundo
não faz fuque fuque,
o mundo é um só,
o mundo é sempre igual.
 
 
San, 25/02/13

Dicionário

 
Um dia,
doce dia,
inconsequente dia,
abri meu coração
e achei um dicionário.
 
Alegre,
curiosa,
desejosa,
animada, 
ansiosa,
faminta, 
fui virando
sofregamente
as páginas.
 
Logo percebi
estranha ordem,
verdadeira desordem,
falta de sequência
lógica,
regras,
indicações.
 
Fui me perdendo,
achando,
caindo,
levantando,
quebrando,
criando,
admirando,
pedindo,
concedendo.
 
E risos,
sim ouvia risos,
a cada coisa perdida,
e aplausos,
igualmente aplausos,
a cada outra
restituida.
 
Já cansada
de tanto procurar nexo
naquele estranho
e complexo
pai de todas,
fui em busca
do autor,
maniaco,
bebado,
transloucado
criador,
e nada,
nenhuma indicação.
 
De tonta que estava,
já desvairada,
consumida em tão absurda tarefa,
percebi um que funesto,
perplexa assumi
minha impotencia,
e pelo bem
da minha própria ciência.
decidi fechar
meu coração.
 
San, 26/02/13 
 

Poetry

Sou uma criatura
de palavras,
fermento do bolo,
coalho do leite,
tempero da sopa,
doce do suco.

Sou uma criatura
de palavras,
bonitas,
estranhas,
amistosas,
indelicadas,
famigeradas,
assepticas.

Sou uma criatura
de palavras,
me alimento delas,
as alimento,
as mastigo, saboreio,
floreio, cuspo, reinvento,
paro e observo,
absorvo.

Palavras existem que não me suportam,
se escondem, me ignoram, me agridem,
outras me amam, acalentam, paparicam, procuram,
algumas absurdamente me acusam
de ladra, embusteira, melindrosa, fanfarrona,
adultera das substancias
que fazem o cerne das palavras.

Sou uma criatura estranha,
sofro as consequencias.


San, 26/02/13

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

ESTRANHOS


Engraçada essa tal liberdade de pensar,
de pensar o que eles querem,
da forma como eles entendem,
na direção que eles imaginam,
com palavras escolhidas
por eles.

Engraçada essa tal liberdade de falar
contanto que não se toque em dogmas,
contanto que não se toque em medos,
contanto que não seja muito lucido,
que não seja muito verdadeiro.

Engraçado ver essa tal boca
que abre e fecha
e não diz nada,
esses ajuntamentos de letras e fonemas
que não tem sentido,
somente limites,
engraçado ser pecado se expressar.

Engraçado porque eu acreditei ter nascido livre,
que tivesse nascido dona de mim mesma,
para experimentar novas formas,
novas idéias,
não sabia que tinha nascido para agradar aos outros,
viver para prestar serviços.

Engraçado não poder
ser fiel a mim mesma,
não poder me expor,
ser sincera.

Engraçado eles não saberem 
que não somos mesma carne,
e sim diferentes vidas,
sentimentos,
outras consciencias.

Engraçado alguém me julgar.

San, 23/02/13

De passagem


Expor a minha fragilidade
me causa alívio,
a perfeição é um fardo grotesco
que por muito tempo
me senti compelida
a carregar.

Vou lhe falar
das minhas intensas dores
como quem conta
de uma divertida e exótica
viagem
que não deu certo.

Meu corpo não deu certo,
minha familia não deu certo,
minha mente não deu certo,
minhas emoções não deram certo,
minha vida não deu certo.

E continuo caminhando,
ainda não cheguei
ao meu destino final,
nem sei qual seria esse,
mas caminhar me traz força
e liberdade.

Os amigos não deram certo,
os objetivos não deram certo,
o credo não deu certo,
as fantasias não deram certo,
o mundo não deu certo.

Apenas caminho.


San, 25/02/13

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Mirror

Procuro seu rosto
entre o meu
no espelho,
pequenos detalhes,
um meio sorriso,
o dedo levemente
apontado
outra direção.

Deixo um recado,
um pequeno peixe
mergulhando
em direção
a um vórtice,
sei que entenderá.

Colo fotos,
lugares
em que estaremos
juntos,
casas
que construiremos,
a lareira
das nossas conversas
noturnas.

Minhas tardes
são feitas
de frieza,
constância
e silêncio.

Canto para o espelho,
sei que ouvirá.


San, 18/02/13



quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Na vida



Nascer é um ato de insanidade,
é uma afronta a sabedoria,
uma agressão ao bom senso,
pura rebeldia,
mas fazemos isso.

Numa louca corrida,
sem medir consequencias,
sem saber o que nos espera,
mergulhamos numa massa gelatinosa
e ai, aprisionados,
somos completamente transformados.

Quase batraquios,
temos rabo,
assexuados,
bi partidos,
9 meses é preciso
na nossa definição.

E assim nascemos
ainda inacabados,
totalmente frageis
e dependentes,
sem nenhum recurso
palpavel
para nossa sustentação.

Diante de tudo
ainda me assombra
como é possível
existirem tantos?

Nascer é o primeiro ato de fé,
completo desconhecimento,
da loucura,
de tudo que somos capazes,
intensas maravilhas,
nascer é um ato de magia.

San, 11/02/13

LA MUERTE

Todos os mortos são soberbos,
deitados em caixões luminosos,
mãos apertadas sobre ternos perfeitos,
segurando flores brancas puras e perfumadas.

E ficamos ali ao lado
chorando tanto pelo outro
como principalmente por nós mesmos,
e tendo a consideração do respeito
a aqueles que nunca mais precisarão disso.

A morte é como um grande apagador
na lousa da curta e besta vida,
apaga pequenas mentiras, corriqueiros vicios,
tolices diarias, enganos costumazes,
a morte traz um vapor de amnésia.

E a morte embeleza muito certas pessoas,
resolve coisas que a vida nunca resolveria,
faz com que coisas feias sejam perdoadas,
coisas absurdas tenham lógica,
até mesmo os piores dos piores
podem ser amados após se defuntar.

Assim é a morte,
execrada e ao mesmo tempo admirável,
ela acontece uma unica vez e é para sempre,
intensa, sem subterfúgios, medida inteira,
nos levando ao unico lugar
em que seremos absolutamente iguais
e que estaremos todos juntos.


San, 13/02/13

Dramática


Geralmente sou tão dramatica
quanto um filme noir dos anos 40,
só que estou em 2013
e isso é considerado bem ridiculo.

Descompensada,
é o que eu vejo nas entrelinhas,
descompassada
é como sinto minhas emoções.

Acelero até 1.500 e de repente paro em 5,
indo da pura excitação
e ansiedade
a descrença e nulidade.

Preocupada que sou em estar limpa,
cheirosa e macia,
acabo ficando dois dias
sem tomar banho.

E por que?

Essa questão me consome,
e como uma vela que vai chegando no finalzinho
derramo por todos os lados,
na familia, nos amigos, nos vizinhos,
até mesmo nos desconhecidos,
queimando, machucando ou incomodando.

Um dia uma pessoa tão facil,
disponível, objetiva, calma, alegre,
no outro um cacto,
fechada, calada, nervosa, taciturna.

Amo o planeta, odeio o mundo,
preciso das pessoas, renego o ser humano,
quero me exibir, não deixo ninguem me conhecer,
gosto de mim mesma, recuso minha identidade.

Não, não é facil me suportar,
quanto mais me entender,
não tenho bula como os remédios
e se tivesse as contra indicações
e efeitos colaterais
tomariam a maior parte da informação.

Tem horas que não sei para o que vim
e me sinto boçal, banal, frugal,
em outras esta tudo esquematizado
na minha mente,
sou genial, soberba, unica, formidável.

E passo de um tom para outro
em poucos minutos,
ouvindo uma musica,
conversando,
vendo um filme,
lendo um livro,
coisa louca.

É como se eu não tivesse um fundo,
então vou caindo pela vida,
vivendo todas as experiências
ou sensações
até as que não são minhas.

Enfim cavei os bolsos culturais,
médicos,
existenciais,
psicologicos,
artisticos
e descobri um tanto de gente
mais ou menos assim,
pessoas que eu considero
no minimo
desajustadas.

Talvez seja isso,
eu tenho tentando a muito tempo
me ajustar na roupa errada,
da forma errada,
na hora errada,
tudo esta certissimo
mas em outra dimensão.


San, 13/02/13




Não era doce e se acabou


Tem amores que começam bem
e vão perdendo o sabor, a textura,
a vontade de querer mais
com o passar do tempo.

É uma coisa comum
afinal não há como fugir da entropia,
caminhamos para o final,
o fim do corredor,
o fim do beijo,
o fim do orgasmo,
o fim dos olhos nos olhos.

Então nos conformamos,
guardamos pequenas lembranças
e grandes saudades
de um tempo que achavamos
"era eterno".

Esses amores bondosos no inicio
e insipientes no final
não nos roubam a vontade
de um novo frio na barriga,
pernas bambas,
mente vazia,
labios quentes.

Mas tem o amor nebuloso,
rispido, maldoso, invertido,
aquele que desde os primeiros ois
nos deixam sedentes e famintos,
exaustos e desorientados,
inseguros, maltrapilhos.

É um amor que nunca sera doce,
que nunca tera ritmo,
chão, base, preceitos,
que é desorientador
e desestruturador,
faz a alma clamar solidão,
e o corpo se ressentir
dos desejos.

Não sei porque acabamos
nos envolvendo com um amor assim,
um amor "não-amor",
"não-isso", "não-aquilo", "não-você",
que faz doer pontos do corpo
que nem conheciamos.

Esse tipo de amor
desconstroi a força da troca,
parceria, solidariedade, mutualismo,
quebra nossa vontade "do outro",
decepa nossa alegria.

Se nos primeiros momentos
tivessemos a clareza
dos ultimos,
se nos primeiros beijos
tivessos o antidoto
dos maus amores,
teriamos sim um coração feliz,
despreocupado,
nunca contundido.

San, 12/02/13

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Eu vejo vocês


Fomos separados por um grande mar,
e muitas discórdias,
juntados pela determinação
e fortes histórias.

Pequenas mãos calejadas
carregando grandes panelas vazias,
rostos tristonhos, cansados, vincados
guardando coragem e dor.

Gente que perdeu a terra,
amor, mãe, bandeira,
mulheres carregando
pequenas trouxas,
roupas de filhos mortos.

Minha vida é a pintura
de suas esperanças e tormentos,
minhas lagrimas as centenas
daquelas que nunca 
foram vertidas,
minha boca canta
a canção da partida.

E eu estou aqui,
sobrevivi,
carrego todos os pesos,
vivos todas alegrias,
respondo todas as perguntas,
como em todos os pratos,
e me farto,
da vida que me foi presenteada.


San, 04/02/13

Necromante



Doce,
doce querida,
nua, frágil, ardente,
meus gemidos são ecos
desesperados,
lancinantes,
perdidos no homem oco
no qual me transformei.

Doce,
doce querida,
sua presença diafana permeia
e entremeia
minhas horas
de homem louco.

Doce,
doce querida,
no universo tolo
do meu cotidiano
sou um necromante,
a exigir seu corpo,
sua luxuria,
para concretizar
o eternamente prometido.

San, 04/02/98

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Are you free?


Quero viver
com as minhas próprias pernas,
quero olhar o mundo
 pelo meus próprios olhos,
então não lhe entrego 
minha consciência,
venha buscar na força,
é minha vida a razão de estar aqui.

Eu não tenho nada para lhe dar,
eu só quero viver,
eu só penso amar,
envolvido pelo seu ódio,
entre as suas armas,
você me ameaça,
mas não me cala.

Quero dançar a musica errada,
quero subir como aranha pela porta,
o que é meu não é seu,
nunca será seu,
eu não lhe dou o que esta comigo.

Você me ataca, atraca, persegue
me ata a corrente do fluxo cego,
com seu mãos sanguíneas,
tenta calar minha boca
com sua força bruta.

Eu carrego a dor
dessas questões malditas,
nunca explicadas,
nunca resolvidas.


San, 02/02/13

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

No caminho de Swann

 
Hoje mais se escreve
no computador,
coisa sem graça escrever
num teclado plano,
cinza ou preto,
uma especie de tábua
em que podemos colocar
e retirar as palavras,
fazer ou guardar para depois,
 mandar rapidamente
para os amigos,
em ficticios envelopinhos
que caminham da grande caixa
por de fios, conexões, bits, nuvens.
 
Os diários são digitais,
não mais folhas pardacentas
amarradas por grossos cordões,
envoltas em capas de couro
e não trazem mais 
surpreendentes descobertas,
secretos desejos,
faltas não ditas,
porque nada no agora
é verdadeiramente surpreendente,
nada é escondido,
exclusivo,
secreto ou segredo,
tudo é revelado como um show,
uma brincadeira entre amigos,
tudo é aberto,
exposto, martelado, mastigado,
visto por quem desejar.
 
Conhecimento da lingua
não é mais necessário,
nem ao menos boas
e novas idéias,
é possivel ter sucesso
e ser reconhecido
apenas reproduzindo,
incansavelmente,
coisas bobas
que já estão circulando por ai,
coisas que ninguém sabe
de onde veio
mas que servem para preencher
espaços vazios,
dar a impressão de ter algo,
não é preciso ter nexo,
as ridiculas são as melhores.
 
Então por isso determinei
que meu ultimo ato de vida
será escrever,
quero ser abraçada pela morte
com a pena em punho,
vacilante,
sujando a folha
com meu suor frio,
deixando para trás
minha ultima poesia,
a perfeita, a chave, o ápice.
 
E que isso não seja filmado,
fotografo, postado,
dividido com mais ninguém,
cairá uma última árvore,
silenciosa,
numa floresta
desconhecida.
 
 
San, 01/02/13

BRUTA


Tão linda que é quase bruta,
derruba todas perguntas,
cala todos meus medos,
sem uma unica silaba.
 
Afrontar seus olhos
é dormir um homem
e acordar menino.
 
E me vejo voltando
a arida Sicilia,
tão esperançoso da vida,
como no dia
do meu nascimento.
 
Tão bela que é
você.
 
San, 30/01/13

B I R I T A


Adoro a sonoridade das palavras antigas
BIRITA, BREJEIRA, BEMDECANA, BELAFEIA,
formas estranhas e poeticas de falar
das coisas mundanas.

MALACAFENTA, MUZAMBENTA, MULAMBA,
formas complicadas de falar
de coisas da vida de todas as coisas.

Porque os "deantigamente" sabiam
que a vida era cheia de coisas ruins,
chatas, incompreensiveis, delicadas,
incomodas, estranhas, sem nexo, dolorosas,
coisas que faziam parte da vida
querendo ou não,
entendendo ou não,
lutando ou não contra elas,
eram simplesmente da vida,
e as pessoas viviam com elas e apesar delas,
as pessoas viviam.

E lá estava eu,
bem me lembro,
feliz da vida comendo meu x-miséria,
como se fosse um caviar,
essa coisa que eu nunca tive coragem de comer,
satisfeita da vida tomando minha grapette,
enternecida com um simples chiclete-rosa-morango velho.

Sim,
eu também era outra criatura,
tinha asas nos pés na amarelinha,
tinha mãos espertas de bater figurinha,
olhos que contavam piadas,
pulmões bons de fazer bolhas de sabão,
ombros de dançar quadrilha.

Sim,
a vida podia ser estranha e dura,
mas meu coração era mole
e aconchegante.


San, 01/02/13