terça-feira, 25 de novembro de 2014

Off the road



E vou vagando pois
por paisagens 
que não conheço,
nem escolhi,
sem os mapas 
que poderiam ter
meus pais,
desapercebida 
de tudo
que nesse caminho 
leva e traz.

Piso em falso,
torço o pé,
ralo a mão.
dou topada,
machuco 
a consciência
e o dedão,
fico cansada,
afogueada,
desidratada,
esfomeada,
desesperada,

Paro,
sinto o vento,
balanço a perna
suavemente,
canto uma canção,
e me afago
com a beleza
simples
a minha volta.

Caminho
com 53 malditos
e 53 benditos,
a cada 53 metros
dou 53 suspiros,
e uma longa 
e profunda 
respiração.

O tempo passa,
lava e seca,
o tempo 
também esfrega
sua supremacia
na nossa cara.


San, 24/11/2014

Dilema



Extra
ordinário,
extraordinário.

Obsceno,
objeto,
objetivo.

Dilema,
lema,
diletante.

Confuso,
fosco,
fraco.

Sede,
sedação,
silêncio.

Esmiuçar,
esmerilhar,
expor.

Toda a vida é feita de palavras
que soltas não significam quase nada
mas juntas podem ser a diferença
entre a nobreza e a indecência,
entre a tranquilidade e a selvageria,
entre morrer hoje ou esperar mais um dia.




San, 25/11/2014

Apenas o necessário


Na atualidade
simplicidade
é uma crença 
inaceitável.

Desistência,
preguiça,
repressão,
fraqueza,
medo,
visão curta,
burrice,
pobreza.

Quem pode 
quer mais,
quem não pode 
também quer.

A vida é ter,
ter mais,
muito mais,
mais ainda,
pompa, luxo,
colorido, brilho,
ostentação,
ofuscação,
grandiosidade.

Por que menos
se podemos ter mais,
se podemos ter tudo?

Colecionando fatos,
pessoas, objetos,
animais, lembranças,
a vida que vale a pena
tem que ser preenchida
até a borda,
todos os segundos,
todos os dias,
todas as emoções,
todas as situações,
todos e tudo.

Não é preciso nexo,
não é preciso bom senso,
não é preciso analisar
o custo real do desejo
compulsivo
de aparecer.

Simplicidade
é para os mortos,
simplicidade
é para os idiotas,
simplicidade
é uma ideia obscena,
simplicidade
é anti vida.

Simplicidade
é aquele desejo 
estranho
que se gruda a nós
quando 
o que estava dentro
saiu para fora
e o que estava fora
não conseguiu entrar.




San, 25/11/2014

Suave


Por que tudo tem que ser 
a ferro e fogo,
um estampido,
um jorro?

Por que temos que enfrentar
correr, brigar, gritar,
se impor, sofrer,
para chegar a algum lugar?

Por que as coisas precisam ser
conquistadas, usurpadas, 
disputadas, vencidas,
perdidas, tomadas, 
para ter seu valor 
reconhecido?

Por que o que é belo
é sempre o belo fabricado,
o belo construído,
re-inventado,
despido do seu original?

Por que tememos a vida suave,
tocante, respeitosa, moderada, 
bondosa, simples, amistosa, 
despojada, fácil, compartilhada?

Por que tudo tem que ser 
dor, perda e dano
para nos rendermos
no final?



San, 25/11/2014

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Au Revoir



Perdi seu endereço,
seu telefone esqueci,
e não quero mesmo
lhe dizer mais nada.

Nenhum soneto,
poesia, musica, 
crônica, conto,
frase, ditado,
nem um UI 
e nem um AI.

Perdi também a vontade
de entender sua irracionalidade
sua vazão bestial de emocionalidade
sua visão diferencial própria
tão torta, tão promiscua.

Sai do seu espaço curvo,
cantinho apertado
embaixo da escada,
sai da sua vida minguada,
sua vida de porres marcados,
sua vida de truco.



San, 24/11/2014

Inteira


Se me permite um aparte
não queria mais fazer parte
do destrinchamento e canibalização
dos diversos membros mais pobres
da população.

Então matei meu monstro voraz
selando sua bocarra rota,
e ele teve que sobreviver
apenas do prana do respirar,
e foi definhando, esmorecendo,
desarticulando,
enobrecendo.

Até que num dado momento
nada mais conseguia fazer de besteira
e foi viver silencioso no mato,
plantando tomate e couve,
colhendo açaí e banana,
dormindo em rede,
remando barco rio acima,
rio abaixo,
tomando chuva sem capa,
tomando sol sem chapéu,
modelando tijolo,
quebrando taquara.

Sem luz, sem água encanada,
sem privada, sem computador,
sem livros, sem celular,
sem comida congelada,
sem 1.500 amigos,
apenas a vida de gente tosca,
apenas essa vida 
de gente inteira.




San, 22/11/2014

Plenitude Visceral


É admirável 
o volume de fezes
que conseguimos fazer
todos os dias,
em todos os lugares,
por todos os motivos,
de todas as formas,
através de todos orifícios.
Falantes, pensantes
obvias, delirantes,
excretoras, escritoras,
condutoras, paralisantes,
base da receita
da opinião alheia.



San, 21/11/2014

Abstraio


Cansei de seguir
seus conceitos vazios!

O que faço dessa dor
que não passa?

Aberta a porta da incerteza
perde-se a gerência
da própria consciência.

Não há modelos prontos a venda
de verdades absolutas
e nem de sanidade reconhecida
e aprovada pela maioria.

Somos todos modelos instáveis
absortos no próprio umbigo
tagarelando sem parar nossas memórias,
famintos por prazeres oblíquos,
contraditórios, mórbidos, ambíguos,
mesmo que isso custe
a si mesmo.

Ser humana
não me dá conforto,
apenas confronto,
mais uma dor,
um ponto cirúrgico
preso e solto,
um ponto antigo
que não cicatriza.




San, 22/01/2014

Never again


Absurdo é exigir algo magnifico
quando se é tão banal,
é procurar coisas de extremo valor 
quando não se tem nada precioso interior.

Difícil, complicado, bizarro
é o feio que não suporta o feio,
o coxo que mede a perna alheia,
o negro querendo "branquear" a raça,
o disfuncional que precisa de tudo
milimetricamente correto.

Absurdo é ter
que ser a pessoa
dos seus sonhos.



San, 19/11/2014

domingo, 23 de novembro de 2014

Mais 10 minutos....


Você é irresponsável pela sua vida,
eu sou irresponsável pela minha,
e todos somos irresponsáveis 
por nossa sociedade,
nossa cidade, nosso país, 
nosso planeta.

E assim todos irresponsáveis
tropeçando na preguiça, 
estupidez, ganância,
intolerância, inveja, luxuria
pressa, raiva, medo,
vamos todos separados 
para o mesmo buraco
que criamos juntos.

Contundentes somos
na irracionalidade,
livres e em sintonia para errar
milhares de anos,
docemente apaixonados
pela irresponsabilidade.




San, 23/11/2014


sábado, 22 de novembro de 2014

Muito tarde fui dormir


Só vou dormir 
quando se espalha o cheiro
do sol secando 
o orvalho nas plantas
e todas as coisas 
que a noite depositou
sobre nossas vidas
se desvanecem.

Enquanto pessoas 
escovam o dente,
esquentam leite,
pegam suas pastas,
chaves do carro,
eu me abraço 
ao puído travesseiro de Macela,
me aconchego na penumbra 
deitando sobre dezenas de papéis 
desenhados, rabiscados, amassados,
e de algumas tantas canetas vazias.

Me afundo sem memórias
deixando os fantasmas
cuidando da casa.



San, 19/11/2014

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Todas as palavras

As palavras estavam perdidas, 
solitárias, famintas, com frio, com dor de barriga,
tive que tecer frases para aquecê-las,
capítulos para alimenta-las,
crônicas para cura-las.

E assim já melhores
elas me deixaram
tomaram seu rumo,
seguiram a estrada,
muitos tinham a visitar,
muitos tinham a admoestar,
ensinar, deslumbrar, estimular.

Para protege-las em sua viagem
as batizei pelo espirito santo da poesia,
aquele que me faz querer amanhecer
outro dia e outro dia e mais outro dia.



San, 18/11/2014

Drama Queen


Sou uma pessoa reativa,
de respostas contundentes, 
imprevistas,
dramáticas,
me quebro, me amarro,
mordo as gengivas,
rasgo as roupas,
chuto as paredes.

Depois me acalmo,
de repente nada mais me mágoa,
me transtorna
ou me faz transbordar.

Subitamente mantenho distância
observando e ponderando,
como se fosse mesmo outra pessoa.

Por vezes dou risada,
em muitas acabo concordando
com meu "algoz"
e uma parte de mim se transforma.

Sim,
eu desejo meu aprimoramento,
mas não sei ainda fazer isso sem luta.


San, 19/11/2014

Efeitos colaterais


Você sabe diferenciar uma coisa
estupidamente bela
de outra apenas estupida?

Bem, então vamos falar de competição.

Para muitos a competição
impulsiona a evolução,
estimula o crescimento,
permite o acesso a modernidade,
apenas e tudo de positivo.

Para mim a competição
é como um carro desgovernado pegando fogo,
eu me afasto dela com todas minhas forças
para salvar meu corpo e minha alma.

A competição é madrinha da ganância,
meia irmã da inveja,
prima da luxúria,
mãe da vaidade.

É um remédio doce
com efeitos colaterais amargos,
é uma faca sem punho,
uma panela quente sem cabo.

Simplesmente não existe uma forma segura
de lidar com a competição.

Abandone-a,
apenas abandone-a.

Com certeza o mundo crescerá com mais vagar,
coisas admiráveis demorarão mais a acontecer,
elas terão que esperar
nosso amadurecimento emocional,
a expansão do nosso senso de civilidade,
a visão clara do porque e para quem.

Então teremos muitas coisas belas,
absurdamente belas,
e bem poucas coisas estúpidas.



San, 19/11/2014

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Prece


Quero qualquer coisa de você
que não me faça querer ficar invisível,
ter combustão espontânea,
ser atropelada por um caminhão.

Acho que não estou pedindo o impossível.

Apenas gotas de respeito,
fragmentos de consideração,
menos palavras e mais escuta,
expressões sem os tiques
do "não aceito", "não gostei", "não entendo".

Se for difícil então me esqueça,
atravesse a rua ao me ver,
não responda meus e-mails
não comente sobre minha vida
se libere de lembrar meu nome
me libere de querer algo de você.



San, 19/11/2014


Shaman


Essa é uma musica antiga
que ninguém mais canta
era de um tempo estranho
onde havia esperança.

E tem uma melodia
que poucos conseguem escutar
era de um tempo louco
que muitos podiam sonhar.

Parece agora para nós
apenas um exótico mito
que um dia fomos seres
ainda não divididos.



San, 19/11/2014

Luminoso


Me perco gota a gota
até escoar tudo
e estar tão longe do mundo
que nada mais me espante
que nada mais me balance
e nem me faça pensar

As lembranças se fragmentam 
o mundo desaparece
o escuro me captura
rompendo os limites do ego
caindo no luminoso

E eu vou ficar tão demente
que morra tudo por fora
surgindo um grande silêncio 
que só exista no agora
brotando a consciência.


San, 19/11/2014

Sociedade


Abra sua boca
para que eles possam limpar
as palavras que você
não deve falar.

Sele seus ouvidos
para que você não possa ouvir
as coisas que podem 
lhe confundir.

Feche seus olhos
para que você não possa ver
o que eles realmente sentem
por você.

E sendo tão bonzinho
que só lhes tragam alegria
permitirão que exista
um dia.


San, 18/11/2014

écoutez-moi


No mundo das mil palavras
o meu coração maluco
fez um mantra sem nexo
que me deixa perplexo:
- me escute! me escute!

E ele fala tão baixo
no meio de tantas vozes,
 gritos e disputas,
entre as medonhas musicas
sem parar sussurra:
- me escute! me escute!

Me sinto o cordão vermelho
de um balão perdido,
ou uma carrinho antigo,
caído num canto esquecido:
- me escute! me escute!

Não sei o que desejar,
nem mais o que responder,
esqueci minha localização,
e o rumo para outra direção:
- me escute! me escute!

E de repente me torno
 luzinhas coladas na bicicleta
desse destino cretino,
e me pego cantando
como uma voz tão suave:
- me escute! me escute!



San,18/11/2014

terça-feira, 11 de novembro de 2014

No reino dos fantasmas famintos


As margens do Danúbio
largaram  seus últimos lamentos
antes que o relógio marcasse 
o fim de todo tormento

Faça outra poesia
que os possa ressuscitar
como pessoas plenas
curadas de tanto mal

Pois isso está ali
para a todos lembrar
que eles ainda não tem
o seu justo lugar

Faça outra poesia
que os possa retratar
como pessoas felizes
voltando para seu lar



San, 11/11/2014

Fome



Ele é uma daquelas pessoas
cuja personalidade e temperamento
somos incapazes de entender.

Ele está no escuro
e ninguém lhe conta nada.

Ele é uma daquelas pessoas
das quais queremos distância,
pelo receio de nos impregnar.

Ele está com sede
mas todos os poços secaram.

Ele é uma daquelas pessoas
que se expressam 
sem limites ou inibições.

Esses são chamados loucos
vivem jogados na rua
esses são esquecidos
esses causam nojo
mesmo que sejamos nós
os motivadores de tais distúrbios.

Ele é uma daquelas pessoas
ainda autêntica.


San, 11/11/2014