segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Consequências


Escuto o sopro fantasmagórico
que de vez em quando ronda 
minha inconsciência,
vozes de pessoas indiferentes
como possíveis mortos desconhecidos,
restos de conversas, pedidos, um parabéns
conselhos de 1942, as vezes um aplauso,
um meloso soluço de choro contido.

Depois tudo se mistura
ao som caótico do transito,
da cidade, dos ambulantes,
dos travestis, dos pensamentos,
ligo o radio para chegar 
ao absoluto do acumulo,
o buraco negro,
e ele talvez engula todas as coisas,
a luz, a treva, o pressentimento,
talvez levante o carro
e o jogue em outra zona de conflito.

E o frio que antes era seu estomago
subiu mais a esquerda,
até o coração,
como uma larva gosmenta,
ou a voz falsamente bondosa
do médico verdadeiramente distante
enquanto enfiava a grande agulha.

BIOPSIA...
esse nome sempre me pareceu de uma flor

de uma planta trepadeira,
cheia de pequenos botões brancos e perfumados
que vão subindo pelas paredes e alambrados de madeira
até apodrece-los e tudo ir ao chão.

Por que você me abandonou antes do primeiro olhar?

Antes do primeiro bocejo, antes de qualquer espirro,
cutucada no nariz, coçada de saco, cusparada,

suor nas mãos, boca fedida, grito sem sentido,
antes de ser alguém ou algo
que se pode desrespeitar ou desprezar ?

É isso que você faz com todas as coisas ?

As deixa como um telefone fora do gancho ?

Esperando na esquina enquanto você vai comprar jornal ?

E as vozes distantes se calam,
absurdamente tristes pela minha vida,
como mortos pranteando vivos,
o silêncio corta ao meio a avenida,
ultrapassa o sinal,
atropela um ciclista,
levanta minha mão
para alcançar alguma coisa,
talvez segurar a ponta dos seus dedos
antes da partida.



San, 17/02/2010